Crônicas, Volume Um - Bob Dylan

Tenho receio de cantor/ ator/ apresentador que escreve livro. Tenho desconfiança porque achei o livro do Chico Buarque bem chato, por exemplo. Nunca pensei em comprar um livro do Jô Soares ou, sei lá, do Pedro Bial (ele tem livro?). Acho que vai ser a maior papagaiada. Porém, ano passado tive uma linda surpresa com Só Meninos, da Patti Smith e o mesmo aconteceu com o Crônicas, que ganhei, mas não planejava ler até conversar com a Tati sobre ele. É o primeiro de supostos três volumes de memórias que o "poeta folk" vai lançar.

Volume Um e, por enquanto, único. :(

Dylan conta a partir de seus primeiros tempos em Nova York, perambulando pelo frio, quando tocava em pequenos bares, sem quase receber por isso. Sobre as pessoas que encontra e os lugares que passa e no que isso o influenciou. Como a literatura beat o fascinou e On the Road, que chegara a ser sua "bíblia", não fazia mais sentido.

Ele dá um salto na narrativa, deixando de lado os anos de sucesso bombástico e focando na fase em que queria sumir daquela fama absurda, desconstruir o mito que foi feito dele. Estava exausto e não queria ser chamado de líder de uma geração, não era assim que se sentia. Só queria morar num lugar afastado com sua família e curtir sua esposa e filhos.

Então ele passa para o período em que não era mais o sucesso garantido de antes e pena para conseguir inspiração para um novo álbum, ao mesmo tempo que tenta se entrosar com os músicos e o produtor.

Na última parte, volta pro começo, pra sua admiração a Woody Guthrie, Dave Van Ronk e Robert Johnson e o poder que a música deles teve sobre a sua própria.

Bob Dylan, que sempre fora evasivo em entrevistas, chegando a mentir ou falar absurdos para despistar todo o séquito de fãs devotados, jornalistas abusivos e todo tipo de freaks da sua vida particular, abre pra gente esse diário de lembranças. Um relato daquilo que lhe foi significativo e daquilo que ele quer contar. Aconselhado ler ouvindo seus discos (apesar de ele nem citar os mais famosos). Pena que sabe-se lá quando/se vamos poder ler as continuações.

Extrações de Crônicas:

"Ela [a avó materna] era cheia de nobreza e bondade, e certa vez me disse que a felicidade não está na estrada que leva a algum lugar. A felicidade é a própria estrada. Também me ensinou a ser gentil porque todo mundo que você encontra está travando uma dura batalha."


"As canções de folk são evasivas — a verdade a respeito da vida, mas a vida é mais ou menos uma mentira, só que é exatamente assim que queremos que seja. Não ficaríamos confortáveis de nenhuma outra maneira."


"As coisas são quebradas, quebradas outra vez, transformadas em outra coisa, e então quebradas de novo."


"Você vive com o que a vida lhe oferece. Temos que fazer as coisas se encaixarem."


"Lembre-se, Robert, na vida pode acontecer qualquer coisa. Mesmo que não tenha todas as coisas que quer, seja grato pelas coisas que você não tem e não quer ter." — conselho de seu pai